sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Uma visão do inferno

Ofereço para vocês um curto episódio que acaba de preencher os papéis de um dos meus cadernos. Ele está na abertura do meu principal projeto que recebeu o nome provisório de "Memórias de Manakel". Para quem não sabe, o livro em questão retrataria a vida do anjo renegado Manakel que teme tornar-se um demônio, o destino de todos os caídos.

 "Londres; na madrugada gelada de uma quarta-feira qualquer; entre o meu tempo e o seu.

 Havia uma ruiva em sua frente. Uma maldita ruiva que conhecia tão bem. Estava sorrindo, tão animada quanto uma criança ao ganhar um novo brinquedo. Seus olhos verdes como duas esmeraldas frias brilhavam. Bastou um toque dela e a garota começou a cair num abismo infinito, onde inúmeros braços apodrecidos saiam das paredes para rasgar sua carne a arrancar-lhe pedaços, famintos por vida. Eles lhe seguravam e puxavam. Gemidos de dor ecoavam por todo lado junto com o cheiro fétido de carniça. Ela não podia se mexer. Um par de braços lhe abraçou, prendendo-a contra o paredão, e ela pode ver a paisagem à frente: uma cidade de ruínas negras por onde milhares de condenados eram chicoteados enquanto se dirigiam para uma torre que se erguia além do céu vermelho. Antes que ela visualizasse melhor aquele mundo de dor, os braços puxaram-na com mais força. A garota agora podia se mexer, mas de nada adiantava, pois quanto mais tentava se libertar, mais os braços lhe puxavam e seu corpo era engolido pelo muro. Outros braços cobriram seus olhos e sua boca, trazendo-a de uma só vez para dentro deles.

 O breu total deu lugar a um painel branco manchado, que ela demorou vários segundos fitando antes de reconhecer como parte da parede de seu próprio quarto. Esquecera como mexer os braços e as pernas, sentia-se tão morta quanto no sonho. Porém não podia ficar ali para sempre. Finalmente o corpo lhe respondeu e o tronco se inclinou para frente. Tudo agora doía. Ela deslizou uma das mãos pelo rosto e o cabelo assanhado. Olhou em volta: era apenas seu quarto, iluminado superficialmente pelos fracos raios de um sol que não nasceu. Ela pôs o cobertor em sua volta, o calor do sonho dera lugar ao frio de uma madrugada vazia..."

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